quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

Comunidades da Região Mata Sul de Pernambuco denunciam violência e buscam pela autoproteção




Oficina realizada pela Campanha Contra a Violência no Campo em Palmares reúne dezenas de participantes para analisar o risco e estruturar mecanismos de segurança popular contra os conflitos por terra e despejos


Por Cláudia Pereira  | APC 


Em um cenário de escalada da violência no campo, a Campanha Contra a Violência no Campo realizou no dia (2) uma Oficina de Autoproteção Comunitária na cidade de Palmares, (PE). O evento reuniu mais de 30 participantes de mais de dez comunidades da Região Mata Sul que vivem sob constante ameaça em seus territórios devido a conflitos fundiários.


O objetivo da oficina foi analisar o contexto de risco e estruturar mecanismos de segurança popular diante da intensificação dos conflitos por terra. A atividade foi ministrada por Paulo Cesar Moreira, da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), por meio do Projeto Defendendo Vidas e Projeto Semente de Proteção e contou com a participação de Gabriel Teixeira (Associação Brasileira de Reforma Agrária - Abra) e Jardel Lopes (Secretário Executivo da Campanha).



A Raiz do Conflito: Crise da Cana-de-Açúcar

A origem da disputa territorial na Mata Sul está diretamente ligada à crise da monocultura da cana-de-açúcar. Com a falência de usinas, ex-funcionários que residiam nas fazendas, desamparados e sem o recebimento de acertos trabalhistas, permaneceram nas terras como forma de garantir a própria subsistência e o cumprimento de seus direitos.


O quadro se agravou quando as usinas iniciaram processos de arrendamento ou leilão de seus engenhos. A partir de então, intensificaram-se as iniciativas de expulsão das famílias, seja por meios violentos ou por ações judiciais de reintegração de posse. Lideranças relatam que, desde 2015, o aumento de situações de risco e ameaças constantes mudou drasticamente suas vidas.

Relatos de Violações e ameaças diárias

Durante o encontro, os participantes trouxeram relatos detalhados das violências sofridas. A dimensão das violações abrange desde violência física e ameaças de morte até intimidações e "tocaias". Houve menção a episódios de grande gravidade, como o sequestro de uma liderança e o assassinato de uma criança de 9 anos dentro de casa.

Outras táticas de pressão mencionadas incluem ameaças de despejo e ação policial, grilagem de terras, uso de agrotóxicos como "arma química", invasão de patrimônio, instalação de cercas em territórios ocupados, supressão de vegetação e a violência psicológica contínua.


Ausência Estatal e o apoio da CPT

A Oficina de Autoproteção focou em auxiliar as lideranças a refletir sobre a dinâmica dos conflitos, analisar o risco específico e elaborar táticas eficientes de autoproteção comunitária.

Um ponto crítico levantado pelas comunidades foi a ausência de apoio do Estado e do Poder Judiciário na resolução das questões fundiárias e na proteção de suas vidas. Nesse vácuo, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) foi mencionada como a principal aliada, oferecendo suporte jurídico, mediações políticas e apoio essencial nas reuniões de resistência. A CPT, juntamente com a SMDH e a Abra, compõe a coordenação da Campanha.

A Campanha Contra a Violência no Campo, reúne diversas organizações da sociedade civil, atua na região desde 2024. Seus objetivos centrais são compreender a natureza dos conflitos, denunciar a violência, incidir junto aos órgãos estatais, proteger as comunidades e promover o reconhecimento dos direitos territoriais. O Fórum das Comunidades em Conflitos da Mata Sul de Pernambuco se reúne bimestralmente, com apoio da CPT, para dar encaminhamento à luta por esses direitos.


Foto: Cláudia Pereira 


Povos e Comunidades Tradicionais publicam Carta-Denúncia sobre a violência e a impunidade


Foto: Cláudia Pereira

Documento final de seminário nacional critica a ausência do Estado e a aliança entre o capital e o poder público em um cenário de ameaças e assassinatos de defensores da "Casa Comum"


Por Cláudia Pereira | APC


O Seminário Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais Contra a Violência e a Impunidade foi encerrado com a publicação de uma carta-denúncia. O evento, que reuniu representantes de diversas comunidades ameaçadas por conflitos territoriais com o Capital e o Estado, teve como objetivo principal expor a crescente violência, a grilagem e o ciclo de impunidade que afetam diretamente os povos do campo, das águas e das florestas.

O último dia do seminário, que refletiu a negligência do Estado sobre a violência contra os povos e a natureza, começou com uma forte mística realizada em forma do Teatro do Oprimido. A encenação retratou a realidade vivida nos territórios, onde uma camponesa, cujo seu contentamento era a terra ancestral para plantar a subsistência, é perseguida e morta pela cobiça de grileiros e fazendeiros.


Após a mística, que ilustrou a luta cotidiana dos povos, o seminário finalizou com trabalhos em grupo e uma reflexão importante  sobre a proteção das vidas ameaçadas por defender seus territórios. Entre os pontos debatidos esteve o programa de política de proteção a defensores, alvo de tentativas de derrubada pelo setor do agronegócio no Congresso Nacional.


O grito de alerta dos territórios

A carta final, assinada por povos vindos de todas as regiões do país, será encaminhada a organizações e organismos do Estado. O texto expressa a gravidade da ausência estatal, sobretudo em relação à política de proteção.


O quadro de violência relatado no encontro é extenso e inclui violações de direitos humanos básicos, como assassinatos, ameaças de morte, tentativas de homicídio, invasão de territórios, uso de agrotóxicos como arma química, vigilância armada, aliciamento de lideranças e a privatização de recursos naturais, como o mar e o mangue. Centenas de pessoas vivem sob ameaça de morte e relatam não se sentir seguras, mesmo aquelas incluídas em programas estatais de proteção a defensores de direitos humanos e ambientais.


Diego Correia, um dos participantes da região Norte, ressaltou a importância do seminário para a conscientização e como "espaço de apoio e também oportuno para falar sobre os conflitos". Ele mencionou que seu território enfrenta diversas dificuldades, como a grilagem e a resistência do poder público, em especial da polícia, e a recente retirada de terras que eram da União.


Foto: Cláudia Pereira

Ofensiva do capital e aliança com o Estado

O documento alerta para a situação agravante em torno do debate da "economia verde" e da "transição energética". O documento ressalta  que, estes temas têm sido instrumentalizados para viabilizar grandes empreendimentos, encontrando apoio significativo no Congresso Nacional.


A carta denuncia a aliança entre o Capital e o Estado, exemplificada pela tramitação de projetos de lei que favorecem a violência contra as comunidades. São destacados o PL Devastação e o Marco Temporal, entre outros instrumentos legislativos que buscam limitar a demarcação de terras e fragilizar direitos.


Cinco propostas para romper a impunidade

As reflexões do seminário resultaram em cinco tópicos considerados prioritários para o enfrentamento das matrizes da violência e para romper o ciclo de impunidade:


  1. Reconhecimento Territorial: Efetivação dos direitos territoriais dos povos e comunidades tradicionais e dos beneficiários da reforma agrária. A erradicação da grilagem de terra pública é apontada como condição indispensável.


  1. Defesa Ambiental e Agricultura: Vinculação da defesa ambiental às políticas agrícolas, sugerindo um zoneamento ecológico condicionado ao Plano Safra e focado em uma transição de base verdadeiramente ambiental.


  1. Qualificação da Proteção: Melhoria nos mecanismos de proteção a defensores de direitos humanos e ambientais para garantir, de forma efetiva, a vida e a segurança desses indivíduos e seus familiares.


  1. Mecanismos de Urgência: Instituição de ritos e mecanismos de urgência para tratar de crimes e ameaças contra populações do campo, das águas e das florestas, visando quebrar o ciclo da impunidade.


  1. Ações no Judiciário: Utilização mais frequente e incisiva de ações junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) e outros organismos colegiados do Poder Judiciário em defesa dos povos tradicionais e da reforma agrária.


Apesar do cenário de violência, as lideranças afirmam manter a "luta e esperança na justiça social e nos direitos", clamando por ações solidárias e coerentes com a defesa da vida e da "Casa Comum".


LEIA A  CARTA -DENÚNCIA NA ÍNTEGRA


Foto: Cláudia Pereira


Povos Tradicionais denunciam a arqueologia dos massacres e a impunidade


Foto: Cláudia Pereira 

Seminário reúne lideranças, pesquisadores e parlamentares para debater a escalada da violência, o racismo ambiental e projetos como PL da Devastação


Por Cláudia Pereira | APC


Após um momento de reflexão e partilha de sonhos, povos e comunidades tradicionais de todas as regiões do país iniciaram o dia (26) com intensos debates em Brasília. Em seminário sobre a violência nos Territórios e a impunidade contra os povos e a natureza. O objetivo central do dia era anunciar e denunciar as violências e violações.  No Centro Cultural de Brasília (CCB), lideranças receberam pesquisadores e parlamentares para um dia dedicado a compreender a escalada da violência que atinge populações do campo, das florestas e das águas em todo o Brasil.


"O objetivo é ouvir os povos e desenvolver estratégias contra a violência, apoiando lideranças e fortalecendo políticas públicas, além de promover mecanismos de escuta para enfrentar conflitos", afirmou Jardel Lopes, secretário executivo da Campanha Contra a Violência no Campo.


O evento, trás lema o compromisso dos povos com a vida e a luta pela soberania, focou a discussão na impunidade, visibilizando denúncias e apresentando dados cruciais sobre a violência e a grilagem. O encontro contou com a participação dos deputados federais Erika Kokay (PT-DF) e Nilto Tatto (PT-SP).


Massacre no Campo: violência física e química

Os dados levantados por pesquisadores, somados aos testemunhos das lideranças, confirmaram um quadro de brutalidade crescente nos conflitos. O debate não se limitou à agressão física, destacando também a violência química, o impacto da monocultura e do uso intensivo de agrotóxicos. O levantamento, que reúne casos de violência e impunidade no campo desde 1985 (período da Nova República), foi realizado em conjunto por um grupo de universidades públicas e pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), mantendo atualizados os dados do contexto agrário nacional.


Segundo a análise, o modelo de agronegócio, apesar da maquiagem política e social, mantém sua essência na estrutura tradicional do latifúndio. A pesquisa evidencia a fragilidade do Poder Judiciário e denuncia a violência contra os povos comunitários, reforçando a importância da luta pelo acesso à terra.

O relatório chama especial atenção para a região amazônica, onde os massacres ocorrem de forma endêmica. "À medida que avança o desmatamento, também se provoca o surgimento de massacres", disse o professor Humberto Góes, da Universidade Federal de Goiás (UFG).


Além dos dados, a pesquisa detalha o racismo ambiental sofrido pelos povos. "Os assassinatos e crimes contra a vida são métodos para expropriar não apenas a terra, mas também seus modos de vida, culturas, relações de parentesco e sociais", relatou o professor e antropólogo Edmilson Rodrigues.


Foto: Cláudia Pereira 

Acordo de Escazú e a Arqueologia dos Massacres

Os parlamentares presentes destacaram iniciativas em defesa dos povos, mas ressaltaram a realidade adversa no Congresso Nacional, onde a maioria é ligada ao movimento do Agro.

O deputado Nilto Tatto frisou a urgência de o Brasil ratificar o Acordo de Escazú (no âmbito da ONU para a América Latina e Caribe), que visa a defesa de defensores de direitos humanos e ambientalistas. "O Brasil é um dos países que mais mata defensores da luta. Conseguimos aprovar na Câmara, e falta aprovar no Senado", afirmou. Ele defendeu que a sociedade acompanhe de perto a tramitação para que o acordo se torne lei interna.

Para Tatto, o seminário é fundamental para sistematizar as informações sobre a violência e embasar políticas públicas. "A paz no campo só é possível se houver reconhecimento e consolidação desses direitos, promovendo acesso à terra", defendeu.


A deputada Erika Kokay denominou o estudo como a "arqueologia dos Massacres". "É um ponto de chegada e um ponto de partida. Mais de 2 mil pessoas assassinadas na luta por direitos são vítimas da violência patrimonialista que acha que pode vergar, dominar o Estado e tem poder sobre as vidas", declarou a deputada, ressaltando a importância da pesquisa para denunciar e proteger a vida de quem defende a natureza.

Odília Moraes, da comunidade tradicional de Taboca, no Mato Grosso (MT), reforçou as denúncias: "Viemos para reivindicar as violações de direitos que sofremos desde de 2020. Enfrentamos a queima de casas, grilagem de terra, extração ilegal de madeira e o foco de políticas públicas falhas. Estar aqui é uma forma de dizer: nós existimos, estamos resistindo e precisamos da regularização imediata do nosso território".


Ameaças no Congresso e o PL da Devastação

Entre as maiores preocupações levantadas no seminário estão as propostas legislativas que tramitam no Congresso, buscando criminalizar movimentos de luta pela terra e anular a possibilidade de desapropriação de terras que não cumprem sua função social , um risco de retrocesso a conquistas históricas.


O debate também destacou o peso do poder econômico como principal motor da violência e a necessidade de uma forte atuação política no próximo processo eleitoral, por meio da politização das informações. O objetivo final é levar à disputa eleitoral a construção de uma sociedade inclusiva e democrática.


Na parte da tarde, foram apresentados indicadores do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), do Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP) e da CPT, que evidenciam a crescente escalada de confrontos e ameaças.

Outro ponto de destaque foi o Decreto nº 6.040, que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), essencial para a regularização territorial e a valorização de seus modos de vida.

Um tema fundamental foi o Projeto de Lei PL 2159, o "PL da Devastação", um grave retrocesso ambiental. Alice Dandara, do Instituto Socioambiental (ISA), contextualizou o processo histórico do projeto, que se tornou "moeda de troca" de parlamentares contrários às pautas dos povos.

O texto estará em debate nesta quinta-feira (27), para a análise da manutenção ou derrubada dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Lei Geral do Licenciamento Ambiental. A pressão política visa derrubar todos os vetos, o que faria o PL da Devastação que praticamente elimina o licenciamento ambiental no país, retornar à sua versão original.

Por fim, os povos denunciaram que multinacionais estão explorando minerais críticos e raros para atender à demanda da transição energética. Essa atividade tem resultado na destruição de solo, águas e ecossistemas locais, como nos rios Araçuaí e no Vale do Jequitinhonha, intensificando a ameaça às comunidades tradicionais. A situação é agravada pela aprovação de leis que favorecem mineradoras e diminuem áreas de proteção, a exemplo da Chapada do Lagoão, que é uma Área de Proteção Ambiental (APA).


Foto: Cláudia Pereira



Seminário Nacional denuncia violência e impunidade contra povos e comunidades tradicionais




Evento em Brasília, de 25 a 27 de novembro, reunirá lideranças do campo, das florestas e das águas sob o lema "Lutamos pela paz, justiça e soberania"

Um cenário de crescente violência, marcado por disputas de terra, especulação imobiliária, ataques armados e crimes socioambientais, motiva a realização do Seminário Nacional "Povos e comunidades tradicionais contra a violência e a impunidade". O evento ocorrerá de 25 a 27 de novembro de 2025, no Centro Cultural de Brasília (CCB). 

Com o lema "Lutamos pela paz, justiça e soberania", o seminário reunirá lideranças e organizações do campo, das florestas e das águas. O objetivo é aprofundar a escuta das comunidades afetadas e estruturar caminhos de incidência política para denunciar a grilagem, a violência e a impunidade.

O evento é organizado pela Campanha Contra a Violência no Campo, que agrega mais de 70 entidades da sociedade civil, movimentos populares e pastorais. A organização também é da Articulação das Pastorais do Campo, que inclui organismos como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP), a Pastoral da Juventude Rural (PJR), o Serviço Pastoral do Migrante (SPM) e a Cáritas Brasileira.


Dados alarmantes motivam o encontro

O seminário busca dar visibilidade às diversas violações enfrentadas diariamente pelos povos tradicionais, com base em dados que evidenciam a escalada dos conflitos.

Dados da Comissão Pastoral da Terra, entre 1985 e 2023, indicam que a região amazônica concentrou 44% dos mais de 50 mil  casos de violência agrária no país. Desses, 84% estão relacionados a disputas por terra.

 O último relatório do Conselho Indigenista Missionário aponta 154 conflitos por direitos territoriais em 114 Terras Indígenas, destacando graves ataques armados contra comunidades Guarani e Kaiowá (MS), Avá-Guarani (PR) e Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe (BA).

O terceiro  relatório do Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (2022-2024), que sistematizou dados de 450 comunidades, revela que mais de 32 mil famílias de pescadores artesanais enfrentam violações graves. Destas, 71,4% estão relacionadas à especulação imobiliária, que promove a invasão e privatização de territórios tradicionais.


PROGRAMAÇÃO PREVISTA

O eixo central do encontro será a incidência política. A programação inclui a escuta de relatos, formação e intercâmbio de experiências, além de painéis para análise de dados. Estarão em pauta os impactos do chamado "PL da devastação" e o decreto de Povos e Comunidades Tradicionais (PCT).

Destaques da Programação:

•25 de novembro (terça-feira):

13h30: Abertura do seminário e partilha das realidades.

•26 de novembro (quarta-feira):

Manhã: Diálogo com o tema Massacres e Impunidade no Campo: parlamento e organizações debatem em defesa da vida.

Tarde: Apresentações de dados da CPT, CPP e Cimi, seguidas de um debate sobre os impactos do Projeto de Lei (PL) nº 2159/2021, o "PL da devastação".

•27 de novembro (quinta-feira):

Meio-dia: Encerramento com a aprovação e apresentação da Carta dos Povos e definição de encaminhamentos.

Foto: Heloisa Sousa - CPT Nacional 


segunda-feira, 15 de setembro de 2025

Fogo criminoso destrói roças no Quilombo Açude (MA)


Comunidade quilombola de Açude sofre com as queimadas criminosas


Organizações denunciam ataques sistemáticos, que ocorrem pelo sexto ano seguido que destroem roçados ainda verdes e acusam o Poder Público de omissão 


Em nota conjunta, o Movimento Quilombola do Maranhão (MOQUIBOM) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT-MA) denunciam a continuidade de ataques incendiários contra o Território Quilombola de Açude, no município de Serrano, (MA). Pelo sexto ano consecutivo, desde 2019, a comunidade tem vivenciado à destruição de suas fontes de sustento por  incêndios deliberados em suas roças.


O documento classifica os ataques como uma estratégia sistemática para destruir a soberania alimentar das famílias quilombolas e minar a estabilidade do território. Os atos descritos na nota, avançou este e último ataque relado pelos moradores aconteceram em 23 de agosto. Os criminosos ateiam fogo aos roçados ainda verdes, diferentemente dos anos anteriores quando queimavam as roças prontas para a colheita. Essa ação recente não apenas destrói meses de trabalho, mas também coloca em risco as moradias das famílias e a vida de seus animais.


A nota aponta a repetição dos crimes como uma falha grave do Estado em proteger os territórios ances

trais. Apesar dos Boletins de Ocorrência registrados junto às autoridades, a resposta tem sido a inércia. Segundo o MOQUIBOM e a CPT-MA, a omissão do Poder Público, da Secretaria de Segurança Pública e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) alimenta a impunidade que encoraja os agressores.


Diante do cenário, as organizações exigem providências imediatas das autoridades competentes. As exigências incluem:

  • Investigação imediata dos incêndios, com a responsabilização judicial dos autores e mandantes.
  • Medidas protetivas efetivas e permanentes para garantir a segurança das famílias quilombolas e a integridade de suas propriedades.
  • Ação proativa do INCRA no cumprimento de suas obrigações legais para a regularização fundiária do território, visto como fator essencial para a resolução dos conflitos.
A nota é concluída reforçando que a proteção dos territórios quilombolas é um dever constitucional e com um apelo por justiça: "CHEGA DE IMPUNIDADE! JUSTIÇA PARA O QUILOMBO AÇUDE!"


  LEIA A NOTA NA ÍNTEGRA

FOTO: ACERVO MOQUIBOM




segunda-feira, 1 de setembro de 2025

Documentário sobre comunidade tradicional de MG concorre o 55º Prêmio Margarida de Prata


Foto: João Victor Rodrigues 


Obra que retrata a luta por regularização  fundiária e direitos da comunidade de Cabaceiras, no Norte de Minas Gerais, está entre os finalistas do prêmio de comunicação da CNBB


Por Comunicação | APC


O documentário "Povos da Beira D’água – Comunidade de Cabaceiras, Norte de Minas Gerais" está entre os finalistas na categoria de curta-metragem do 55º Prêmio Margarida de Prata, tradicional premiação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). A obra destaca a luta da comunidade tradicional quilombola, pesqueira e vazanteira por seus direitos e reconhecimento.


Sendo o primeiro filme de uma série de reportagens especial que percorreu cinco comunidades no Norte de Minas, a obra aborda  um dos principais desafios enfrentados pelos povos tradicionais em todo o Brasil: a regularização fundiária. Às margens do Rio São Francisco, o Velho Chico, o filme acompanha a comunidade de Cabaceiras  no diálogo com representações  do Estado e denuncia o histórico de violações. Apoiada pelas pastorais do campo, a resistência de Cabaceiras espelha a realidade de muitas outras na região que buscam garantir o direito fundamental à terra para poderem plantar, pescar e manter viva sua cultura ancestral.

Foto: Cláudia Pereira

O documentário que é uma iniciativa da Articulação das Pastorais do Campo (APC),  se destacou entre mais de 470 inscrições nos Prêmios de Comunicação da CNBB, que visa dar visibilidade a trabalhos que promovem os valores do Evangelho e a dignidade humana em diversas plataformas, como rádio, TV, cinema, internet e produções acadêmicas.

Criado em 1967, o Prêmio Margarida de Prata tem um histórico de apoio à produção cultural independente no país, especialmente durante o período da ditadura militar, valorizando obras que lançam um olhar crítico e sensível sobre a realidade brasileira.

O curta-metragem sobre a comunidade de Cabaceiras entra agora na fase final de avaliação, que será conduzida por um Júri-Pastoral composto por bispos indicados pela Comissão de Comunicação da CNBB. Os vencedores da 55ª edição dos prêmios serão anunciados no dia 23 de novembro.




Ficha Técnica do Documentário:

Realização: Articulação das Pastorais do Campo (APC)

Produção e Reportagem: Cláudia Pereira e João Victor

Direção: Cláudia Pereira e Humberto Capucci

Edição e Finalização: Humberto Capucci

Trilha Sonora: Antônio Cardoso, Zé Pinto, André Souza e Ewerton Oliveira



#PovosDaBeiraDagua #PrêmioMargaridaDePrata #ComunidadeCabaceiras #NorteDeMinas #PovoseComunidadesTradicionais #CNBB



sexta-feira, 22 de agosto de 2025

Melodia da Resistência: A trilha sonora que embala a luta dos povos tradicionais às margens do Velho Chico

Foto: Cláudia Pereira


Composição de Antônio Cardoso para a série documental “Povos da Beira D'água”, da Articulação das Pastorais do Campo, transforma-se em símbolo de esperança para comunidades do Norte de Minas Gerais.


Por Cláudia Pereira| APC


As vozes e as lutas dos Povos e Comunidades Tradicionais do Norte de Minas Gerais reverberam denunciando e anunciando sua ancestralidade e identidade  através da série documental “Povos da Beira D'água”. A iniciativa é da Articulação das Pastorais do Campo (APC) — uma força constituída pelas pastorais irmãs, Comissão Pastoral da Terra (CPT), Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP), Serviço Pastoral do Migrante (SPM), Pastoral da Juventude Rural (PJR), Cáritas Brasileira e Conselho Indigenista Missionário (Cimi). A comunicação da APC percorreu cinco territórios produzindo registros audiovisuais sobre a resistência e a identidade desses povos que esperam a regularização fundiária de suas terras.


A narrativa das cinco reportagens é embalada também pela  trilha sonora emocionante, que transcende o papel de fundo musical. Como um complemento especial à produção, ao final de cada filme, após os créditos, o espectador é presenteado com o clipe da música “Povos Tradicionais”, do compositor e cantor Antônio Cardoso. A canção, é um hino de força e sensibilidade, foi composta exclusivamente para a série.


Foto: Cláudia Pereira


A causa e a memória de um povo como inspiração para a canção 

Antônio Cardoso, conhecido no universo da música cristã católica por sua arte e seu trabalho como catequista, foi uma peça essencial no projeto que surgiu de forma quase ocasional. Cláudia Pereira da equipe de reportagem da APC, enquanto a produção da série era decupada e roteirizada, em um diálogo por telefone contatou com o cantor. A ideia inicial era modesta: solicitar a cessão de um solo de violão para compor a trilha.


No entanto, ao ouvir os relatos sobre as comunidades, suas dores e sua teimosia na resistência de luta, a memória afetiva de Cardoso foi ativada. Ele se recordou de conversas com o saudoso Dom Luciano Pedro Mendes de Almeida e de um momento de vivências junto a essa realidade do povo mineiro. A empatia transbordou em inspiração. O que seria um simples solo de violão floresceu em uma canção completa.


Sensibilizado, Cardoso enviou a melodia em poucos dias. Para a surpresa da equipe, em menos de um mês, a música estava inteiramente produzida, gravada e generosamente cedida para se tornar a alma sonora da série.


“A letra é praticamente uma oração, um acalanto que nutre o "esperançar" não apenas das cinco comunidades retratadas, mas de todos os povos tradicionais do país, especialmente os quilombolas”, disse Cláudia Pereira que produziu a série. A composição traduz em notas tanto a dor da violação de direitos quanto a sublime beleza da ancestralidade.  O clip da música está disponível no canal do YouTube da Articulação das Pastorais do Campo. A produção audiovisual utiliza imagens captadas durante a realização das reportagens nas comunidades, um registro autêntico e próximo da realidade dos povos. A edição e o roteiro são de Humberto Capucci, com cinematografia de Cláudia Pereira e João Victor Rodrigues.


Uma trilha sonora plural

Além da obra de Cardoso, a trilha de “Povos da Beira D'água” é enriquecida pelos talentos dos músicos André Luiz Souza e Ewerton de Oliveira. Os artistas assinam composições originais que enriquecem a imersão e as mensagens nos documentários. Ewerton criou solos de piano que ilustram as denúncias de violência vividas pelas comunidades. Para dar o tom da cultura local, o cantor e compositor Zé Pinto, um dos principais cronistas musicais da luta popular, integrou aos filmes a sonoridade dos povos pescadores e quilombolas com seus acordes de viola, o que enriquece a cultura e a beleza das comunidades que praticam a agroecologia.





As histórias de luta e resistência contadas na Série "Povos da Beira D'água"


As composições ilustram as cinco histórias de resistência documentadas no Norte de Minas. Conheça cada episódio:

1.Comunidade de Cabeceiras (Itacarambi/MG): O primeiro filme aborda a realidade de 30 famílias de vazanteiros e pescadores que vivem às margens do Rio São Francisco. Ameaçados pela pressão de órgãos estatais e pela cobiça de grileiros, eles lutam pelo direito fundamental de manter o modo de vida de seus antepassados, intrinsecamente ligado às águas do Velho Chico.


2.Comunidade de Croatá (Januária/MG): O segundo documentário expõe um histórico de violência que remonta à década de 1970. Expulsões, invasões e incêndios criminosos, orquestrados por latifundiários e pela especulação imobiliária, marcam a trajetória desta comunidade, que reafirma sua  identidade de quilombolas, pesqueira e vazanteira, como ato de resistência.


3.Comunidade de Caraíbas (Pedras de Maria da Cruz/MG): A terceira reportagem é um convite para conhecer o elo sagrado de um povo com o rio. Para os moradores, as margens do São Francisco são o espaço sagrado onde plantam, colhem, pescam e vivem, celebrando uma existência comunitária que resiste em conexão com a natureza e por ser a primeira comunidade tradicional de Minas Gerais a conquistar o Termo de Autorização de Uso Sustentável  (TAUS). 


4.Comunidade Quilombola de Gameleira (Januária/MG): A quarta reportagem aborda reforça a resistência de mulheres, homens e jovens  da comunidade na defesa de seu território, suas águas sagradas e sua cultura. A produção destaca os desafios e as conquistas de um povo que luta incansavelmente pela preservação ambiental, reconhecimento de sua identidade, a luta contra a perseguição de latifundiários e a especulação imobiliária. Sem falar de seus direitos básicos a comunidade luta para manter seu legado ancestral.


5.Comunidade de Canabrava (entre Buritizeiro e Ibiaí/MG): Encerrando a série, o documentário narra a luta da comunidade pesqueira e vazanteira de Canabrava. Há mais de 20 anos, o território enfrenta perseguições e tentativas de despejo forçado, chegando a ser expulsos de suas terras há quase oito anos. O filme se torna mais um instrumento na luta pela retomada e permanência em seu território.


Foto: Cláudia Pereira