Os estados de Roraima, Mato Grosso do Sul e Amazonas lideram os números de assassinatos. Os dados do relatório anual do Cimi apontam que o primeiro ano do governo Lula 3, foi marcado por omissão do poder público.
Por Cláudia Pereira – APC
“Há mais de quinhentos anos sofremos com a violência, todos os dias somos massacrados. Até quando será preciso divulgar relatório de violência contra os povos indígenas?”, questionou a indígena Lucine Barbosa Guarani Kaiowá, no lançamento do Relatório de Violência Contra os Povos Indígenas de 2023 do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O relatório foi apresentado nesta segunda-feira (22) na sede da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Brasília (DF) e transmitido ao vivo através do canal do Cimi no YouTube.
O relatório afirma mais uma vez que a violência contra os povos indígenas persiste e o primeiro ano do terceiro mandato do governo Lula, houve um aumento nas fiscalizações e repressão às invasões em alguns territórios indígenas. No entanto, a demarcação de terras e as ações de proteção e assistência às comunidades permaneceram insuficientes.
Recentemente, os povos Kaingang, Avá-Guarani e Kaiowá foram alvos de ataques armados no Paraná, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul. Os atos violentos confirmam os dados do relatório, que apontam para inúmeras violações dos direitos dos indígenas em várias regiões do Brasil, perpetuando os conflitos, invasões e os altos índices de violência, assassinatos e violência contra mulheres e crianças. Diante ao novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a expectativa para o ano de 2023 gerou esperança ao assumir centralidade com a pauta em relação à política indigenista, após o país atravessar um período difícil no governo anterior.
Um dos fatos que precisa reforçar neste contexto de violações aos direitos dos povos é o marco temporal. O Congresso Nacional atuou contra os direitos indígenas, especialmente através da Lei 14.701/2023. O Poder Legislativo agiu em clara contraposição ao Supremo Tribunal Federal (STF), após concluir o julgamento sobre a demarcação de terras indígenas com uma decisão favorável aos povos originários.
“É preciso muita resistência e mística para suportar tanta dor e tanta morte”, expressou o Cardeal Leonardo Steiner, arcebispo metropolitano da arquidiocese de Manaus e presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O Cardeal afirmou o compromisso em entregar o relatório para o Ministro do Supremo Tribunal Federal e ao Papa Francisco como testemunho do serviço que a igreja realiza no Brasil. “ Na história do Brasil os povos indígenas foram massacrados, uma palavra um pouco agressiva, mas que ainda não consegue dizer a realidade em relação aos povos indígenas quanto à morte, destruição de culturas, desaparecimento de línguas. [...] Nós como igreja católica assumimos a causa indígena”, expressou o Cardeal Leonardo Steiner.
Dados do relatório de violência contra os povos indígenas 2023
Dividido em capítulos, o relatório apresenta a violência contra a pessoa, violência contra o patrimônio, violência por omissão do Poder Público e Povos Isolados. Os dados publicados apontam: 411 casos de violência contra a pessoa, 208 assassinatos, 35 tentativas de assassinato, 17 homicídios culposos, 17 ameaças de morte, 40 ameaças, 18 lesões corporais dolosas, 23 casos de violência sexual, 38 casos de racismo e discriminação e 15 abusos de poder.
Foram registrados através dos dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), 47 assassinatos no estado de Roraima, 43 em Mato Grosso do Sul e 36 no Amazonas. Aumento de 15,5 % de homicídios comparados ao ano de 2022. A morte de crianças é alarmante, 1.040 crianças indígenas com idades entre 0 e 4 anos morreram em 2023 por omissão do poder público. Outro dado preocupante apresentado, foi o registro de suicídios que teve um aumento entre jovens de 19 a 30 anos.
O documento registra 1.276 casos de violência contra o patrimônio, a maioria corresponde a omissão e morosidade em regularização de terras e 276 casos de exploração ilegal de recursos. Os direitos básicos como saneamento e água tem se agravado, sobretudo nestes tempos de crise climática que tem provocado enchentes e estiagem no país e afetam as comunidades indígenas.
O relatório de violência contra os povos indígenas 2023 realizado pelo Cimi está disponível e pode ser acessado em outros idiomas.
“Abrace a causa indígena. Todos nós somos seres humanos, sentimos dor, fome e sede. Todos nós tomamos a mesma água, não temos nenhuma diferença. O que precisamos é que este Brasil pare de nos matar, de nos julgar, e nos olhar como se fossemos nada. Sabemos que para os ruralistas as nossas vidas não valem um centavo. Para eles o que vale são os grãos de milho e de soja. Eles dizem que alimentam o Brasil, mas nós não vivemos de grão, eles não nos alimentam. Nós vivemos dos pequenos agricultores que plantam verduras, produzem comida. Se o Estado não tomar providência, ele irá assistir o massacre dos povos indígenas”, ecoou o grito de Vilma Vera, liderança Avá-Guarani do tekoha Y’Hovy, na TI Tekoha Guasu Guavirá.
#ViolênciaContraosPovos
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