Foram registrados 61 assassinatos no campo, em 2016, segundo o Caderno de Conflitos no Campo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), lançado ontem (17/04) na sede da CNBB, em Brasília. É o maior número de casos registrados desde 2003, ano que tem a maior marca histórica dos 32 anos de dados coletados pela CPT. Os dados de assassinatos de 2016 representam também um aumento de 18% em relação ao ano de 2015.
A 32ª edição do Relatório de Conflitos no Campo Brasil traz mais números alarmantes: o ano de 2016 registrou o maior número de ocorrências de conflitos por terra dos últimos 10 anos, 1295 no total. Foi registrado também o maior número de conflitos por água desde que foi iniciada a pesquisa desse dado, 172 casos.
O presidente da CPT e bispo da diocese de Balsas (MA), Dom Enemésio Lazzaris, atribuiu o aumento da violência no campo, à mudança de governo. “É importante a gente entender que uma das causas da violência no campo são as mudanças. A entrada de Temer no governo fez com que as milícias se armassem”, explicou o bispo.
A região amazônica concentra boa parte dessas violências, 57% do total. Um dos casos emblemáticos que aconteceu na região foi o assassinato da pescadora e militante do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), Nilce de Souza Magalhães, ou Nicinha, como era chamada. A liderança era conhecida na região de Porto Velho (RO) pela luta em defesa das populações atingidas por barragens, denunciando as violações de direitos humanos cometidas pelo consórcio responsável pela construção da Usina Hidrelétrica de Jirau, chamado de Energia Sustentável do Brasil (ESBR).
A filha de Nicinha, a advogada Divanilce Andrade, esteve presente no lançamento e falou emocionada sobre a morte de sua mãe. “Só tomamos conhecimento da dimensão do trabalho da minha mãe depois da morte dela”, revela. A advogada apontou que apenas após a morte da sua mãe, o Ministério Público Federal foi investigar as denúncias levadas ao órgão pela pescadora. Divanilce ainda relatou toda a morosidade e dificuldade para investigar e punir os culpados pelo assassinato da sua mãe. Ela conta que teve que catar os restos mortais da sua mãe no rio e circular com os ossos por vários dias até que o Ministério Público aceitasse receber para requisitar o exame de DNA. “A morosidade e omissão são surreais”, critica. Após a via crucis, em dezembro de 2016 foi confirmada a identidade da pescadora. “Quando o DNA, confirmando que era o corpo da minha mãe, chegou, meu mundo desabou porque até então era um sentimento, depois virou realidade. Tudo o que minha mãe sabia de cuidar da terra e do rio se foram com ela”, lamenta emocionada.
O militante do MST, José Valdir Misnerovicz, que foi preso ano passado, por quase cinco meses, numa acusação que tenta enquadrar o MST como organização criminosa, também esteve presente no lançamento. O militante relembrou os vários mártires do campo e foi taxativo. “A violência no campo só diminuirá ou deixará de existir quando acabar o latifúndio”.
Pela primeira vez a publicação traz um levantamento dos projetos de lei em trâmite ou recentemente aprovados que colocam em risco a vida dos camponeses. Segundo o professor e pesquisador da Universidade Federal da Paraíba, Marco Antonio Mitidiero, o que está havendo agora é um ataque aos direitos dos povos do campo. “Todas essas ameaças legislativas criam insegurança jurídica para os povos do campo”.
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