Entre os dias 11 e 13 de julho em Luziânia (GO), no Centro de
Formação Vicente Cañas, 29 alunos apresentaram seus trabalhos de conclusão de
curso em formato híbrido.
Por Assessoria de Comunicação da Articulação das Pastorais do Campo
Segunda turma de agentes de pastorais conclui curso de Direito Agrário |
O ato de concluir nem sempre acompanha um ponto final, para
os alunos que encerram a segunda edição do curso de Especialização de Direito
Agrário, parceria das Pastorais do Campo e a Universidade Federal de Goiás
(UFG), a conclusão do curso é uma continuidade do conhecimento. Entre os dias
11 e 13 de julho em Luziânia (GO), no Centro de Formação Vicente Cañas (CIMI), 29
alunos das cinco regiões do país, participaram em formato híbrido do seminário de
trabalhos de conclusão de curso. O objetivo da especialização é capacitar
agentes das pastorais do campo para fortalecer as lutas e mobilizações,
sobretudo as comunidades tradicionais. A segunda edição teve início em
2019 com aulas presenciais e em razão da pandemia da Covid-19, finalizou este
ano. “Estes dias aqui são de celebração, porque a viagem foi difícil até aqui,
mas chegamos” manifestou Ivanilda Torres ao apresentar sua pesquisa final sobre
o contexto migratório e territorialidade do Povo Warao.
A segunda turma desta edição do curso de especialização de
Direito Agrário foi concluída por 29 membros das pastorais, representados pela
Comissão da Pastoral da Terra (CPT), Conselho Indigenista Missionário (CIMI),
Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) e Serviço Pastoral do Migrante (SPM). Além dos
desafios do cotidiano, durante os dois anos críticos da pandemia, os alunos se
reinventaram no processo de formação do curso. As aulas que no início eram
presenciais, passaram para formato virtual e vieram as adaptações ao tempo e a
tecnologia. Os agentes de pastorais que já possuem características de
aguerridos, estudaram, trabalharam, lutaram e testemunharam os momentos mais
críticos da história social brasileira. Vivenciaram a violência
institucionalizada nas dimensões do racismo, machismo, homofóbico e enfrentaram
o desgoverno genocida. Não bastasse todo esse embate testemunharam a derrubada
de direitos e o país voltando ao mapa da fome.
O curso tem a coordenação geral dos professores Fernando
Dantas e Cláudio Maia da Universidade Federal de Goiás (UFG) e também de
Marline Dassoler Buzatto do CIMI representando as Pastorais do Campo. "Este
seminário é de celebração e reafirmação através da partilha do conhecimento",
disse Marline ao abrir o seminário e apresentar cada um dos alunos e alunas.
Ela destacou que a conclusão desta edição é mais uma ferramenta que contribui
para instrumentalizar as ações das Pastorais do Campo, nas ações de incidência
e denúncia das violações dos direitos dos Povos e comunidades tradicionais.
Para o professor Fernando Dantas, da Universidade Federal de
Goiás, as experiências dos alunos constituíram um reconhecimento ao conhecimento
muito válido. "A conclusão dos trabalhos em Especialização de Direito Agrário,
compõe riqueza acadêmica através de diálogos com povos e comunidades
tradicionais", afirma o professor. Os trabalhos dos alunos apresentaram
contextos das formas de violências no campo e suas consequências,
principalmente para os jovens. Abordaram os conflitos de territorialidade,
denúncias de violações provocadas pelo capital ao meio ambiente, a
invisibilidade da mulher pescadoras e também as mulheres do campo, o processo
migratório, resistência de lutas, ancestralidade e a necropolítica indigenista
brasileira.
Para a turma da segunda edição do curso, as motivações são
inerentes ao projeto de justiça e igualdade. Simone Pegoraro, que integra a
equipe do CIMI do regional Norte I, afirma que a necessidade de qualificação
foi o motivo que a levou a participar do curso. “Preciso estar mais preparada e
qualificada para estar com os povos indígenas e poder de fato contribuir para
as suas lutas”, disse Simone que considera o curso um processo rico em
partilhas do conhecimento. Ela defendeu o tema de usufruto exclusivo do
território dos povos indígenas no Vale Javari (AM). “Escolhi falar sobre
o usufruto exclusivo, porque ainda é um direito não garantido aos povos e é, no
meu entendimento, a garantia de vida. Tendo seus territórios demarcados e poder
usufruí-los, os povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos têm garantido o seu
direito de ser. Porque o território é visto como fonte de vida e não como de
riqueza, que encontramos o espaço para ser e estabelecemos essa relação entre o
território e os sujeitos”. Conclui Simone que considera a especialização como
uma nova ferramenta que fortalecerá as lutas junto aos povos para enfrentar as
violências que sofrem diariamente.
Francisco Silva Sousa, mas conhecido por Chiquinho, é da
cidade de Sobral (CE). Ele atua como agente de pastoral voluntário e coordena
as políticas municipais para os direitos humanos do município. As razões que
levaram Chiquinho a fazer o curso são contundentes com a realidade do seu
trabalho. Com propósito de fortalecer a luta junto a Comissão da Pastoral da
Terra ele alertou para as perspectivas de hoje e de amanhã das comunidades
camponesas. Chiquinho defendeu o tema sobre as interfaces da violência juvenil
e suas implicações nas comunidades rurais. Decidiu por esse tema, ao
vivenciar entre os anos de 2016 e 2019 processos de conflitos em comunidades da
região, que envolveram questões da terra, moradias, água e mineração. O
curso foi a oportunidade para integrar o saber e as experiências diante a realidade
que abrange os camponeses, povos e comunidades tradicionais.
“O curso foi um processo muito importante, a especialização
enriqueceu ainda mais os nossos conhecimentos, entendendo o nosso papel como
agente de pastoral e sem esquecer que o verdadeiro protagonismo é do camponês.
Vamos fazer a nossa luta com organização, força e mobilização. Eu considero
essa vivência do curso diante a este cenário que estamos vivendo, uma grande
ferramenta de defesa aos direitos da vida, no meu caso, o direito da vida da
juventude. Refletir sobre as faces da violência e suas implicações nas
comunidades rurais, é refletir sobre a vida, são estes jovens que vão continuar
na perspectiva da organização e fortalecimento da comunidade. A juventude não é
amanhã, a juventude acontece agora. O curso de Direito Agrário é uma ferramenta
estratégica e potente para este momento do agora”. Afirmou Chiquinho.
O compromisso junto à comunidade do Chiquinho não é diferente
dos demais, Gilsilene Mendes possui formação em serviço social e atua na
coordenação da Pastoral da Terra em Minas Gerais, partilhando da mesma
motivação. Em 2019, ela que participou de um processo de formação sobre Povos e
Comunidades Tradicionais, despertou em Gilsilene o interesse em cursar a
especialização em razão da luta e enfrentamento no estado. Ela que vivencia o
avanço da violação de direitos, levou como tema resistência à mineração na
Serra do Brigadeiro, Muriaé - MG.
“Este curso é mais um instrumento de luta contra este
projeto de morte que tem avançado nas comunidades. A mineração tem avançado sobre
as comunidades e povos tradicionais, destruindo a produção da agricultura
familiar e destruindo as condições e a cultura do povo. Esse curso é a nossa
ferramenta que mostra os caminhos das resistências e esperança. Com o
conhecimento, já estamos mapeando os povos e comunidades tradicionais para
garantir os direitos, sobretudo o direito de existir no território com
políticas públicas, acesso a melhores condições de vida. É uma conquista para
as comunidades. Eu sou grata aos coordenadores do curso, as pastorais do campo
pela oportunidade em garantir mais esta ferramenta para as comunidades”. Disse Gilsilene ao questionado sobre as motivações e a conclusão do curso.
Vinícius Machado é assessor jurídico e integra o conselho
Indigenista missionário no estado do Pará, ele que já estuda direito agrário
desde a graduação e tem envolvimento com os movimentos sociais do campo em
especial a causa indígena, a especialização em Direito Agrário lhe chamou
atenção pelo perfil proposto do curso ser diferenciado pela riqueza de
interpretação. Vinícius considera que a presença das realidades de outras
pastorais e regiões do país ajudaram a analisar as questões jurídicas a partir
da prática e os exemplos concretos. “É uma riqueza ímpar que consegue trazer a
realidade jurídica para o chão e observar as contradições que existem no
sistema jurídico e os limites que são apresentados pelo sistema”. Vinícius
apresentou como trabalho de estudo o direito à consulta prévia na garantia do
direito à territorialidade dos povos indígenas do baixo Rio Tapajós, no Oeste
do estado do Pará da Amazônia Legal Brasileira. Desde a sua graduação em
direito, Vinícius defende a temática de territorialidade dos povos para
preservar a sua origem e cultura em razão de ser a primícia de defesa dos
direitos dos povos originários.
“O curso permite que possamos apresentar estas reflexões,
colocar a luz nestas contradições que são vivenciadas nos territórios e quanto
mais publicarmos e denunciar é melhor, além disso o curso abre a possibilidade
de trazer estes debates para o mundo acadêmico, as universidades que é um
espaço para se fazer ponte entre os movimentos sociais e as universidades”. Acrescentou Vinicius
Gratidão foi uma das palavras mais pronunciadas durante
as apresentações. A conclusão da segunda edição do curso é especial, a pandemia
da Covid-19 afetou as aulas presenciais, e o processo de adaptação do formato
virtual foi complicado para alguns alunos devido a qualidade da internet, além
outros fatores que os alunos passaram no período de quase três anos. Os alunos
relatam que chegar até a conclusão é resultado de seus esforços, mas todos são
unânimes ao falar do incentivo dos professores e também da coordenação das
pastorais representada por Marline Buzatto. “Nossa gratidão ao cuidado e
incentivo da Marline que não largou as nossas mãos e nos trouxe até aqui”.
Manifestou Iricina Oliveira ao apresentar seu trabalho de conclusão sobre a
invisibilidade das mulheres pesqueiras.
“Eu me sinto lisonjeada e feliz. Este curso é fundamental
para mantermos fortalecida a nossa luta. A parceria com a Universidade Federal
de Goiás, pode levar para a academia as práticas vivenciadas por nós
cotidianamente de maneira sistematizada e contextualizada. Fazer parte deste
processo, prestando serviço à causa me fez muito bem e contribuiu para meu
crescimento como pessoa e missionária”. Disse Marline Buzatto.
Os professores consideraram os trabalhos de conclusão dos
alunos bastante aprofundados pela riqueza das experiências relatadas. Para
eles, a segunda edição do curso contribuiu para além do fortalecimento de
ferramentas, o curso contribui para enriquecer o intelecto dos movimentos. Os
trabalhos apresentam um diagnóstico do estado de coisas inconstitucional no
brasil sobre as violações dos direitos dos povos e comunidades tradicionais. “O
direito agrário são as ações com a terra para a produção da vida e, se estas
ações não produzem a vida tem alguma coisa errada. Tudo que vimos aqui são
ações que destrói a vida, apresentadas através dos trabalhos de
conclusão. Que direito agrário é este que viola a vida?” enfatizou
o professor Fernando Dantas.
Após as apresentações, as coordenações das pastorais e da
Universidade federal de Goiás, avaliaram a segunda edição e encaminharam
solicitação para a terceira edição do curso de especialização em Direito
Agrário para o ano de 2023. Sugeriram produção para publicar em livro as
monografias, relatórios e artigos apresentados pelos alunos desta edição do
curso, os professores defendem que o conteúdo é de grande importância para o
mundo acadêmico e fundamental para as pastorais do campo.
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